Gira o torno
gira o ponteiro mais veloz
uma e meia numa tarde absurda
operamos dinheiro dentro das máquinas
operamos o tempo
gira o torno e torna a girar
o sangue frio nos tubos de aço
um riacho vermelho e prata
éramos ópera
cantávamos o apito das dezoito
a noite banhava o sol
uma lua de sabão em pó já apertava os olhos
cantávamos às solas de sapato no barro
a ópera moderna
girava o torno noutro turno
nós a caminho de casa
a família e os filhos da janela
comemos do pão pela manhã
durante o dia o estômago quente
agora a noite, uma sopa do almoço
o p e r á r i o s
mordemos os lábios numa reza vaga
apagamos as sextilhas, deixamos os versos
noutra manhã manchada, marchamos em frente
operários de o p e r á r i o s
vamos operar a rota validez do esforço
o ignóbil agir no arado escravo
e festejar as sombras
beber nesse escuro vão entre as casas
que a noite esconde nos quintais
onde podemos ver a vida mais leve
onde podemos entender os cães
a atirar-lhes estrelas
e ajeitar-nos no sofá remendado
para um momento de paz
operamos o inferno
o p e r á r i o s
operamos um decênio
o p e r á r i o s
operamos as máquinas
e matamos nossos corações maquinários
operários surdos
operam seus dedos
nessas letras
nessas teclas
opero por vocês
que me operam
e operam minha voz
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3 comentários:
A gente tem essa mania de terminar os poemas com uma coisa egocêntrica de nos citar. Vi isso hoje mesmo em outro poeta, de outro lugar e vejo isso sempre. Parece que terminamos mal o poema. Esse correu como navalha e no final vira um chazinho.
Para mim, depois de corações maquinários não precisava ter mais nada.
Enfim, ótimo! E com o velho vício de não bastar só a assinatura, que no fim, já fala do dono da hora. E essa parte eu não acho ótima.
O poema é uma luta interna de nossas sombras com nossas pequenas iluminações. Variavelmente, cada um tem a forma de se fazer presente dentro de cada pedacinho que larga no mundo, e mais variável ainda é essa forma de se largar no mundo cada pedacinho. Cada poema é alguma coisa de novo, se conhecer outros poemas, saberá que não estou sempre a falar deste "eu". Sobre não parar o poema no momento certo, isso é com ele, eu só o escrevo. Tento ao máximo não pensar, só sentir... e sobre sentimentos não se mede, a não ser a medida dos mesmos.
Adorei a postura e a justificativa. Concordo muito. E fico feliz pelo seu dicernimento.
Até os próximos poemas.
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