12.9.07

"Sem título"

Tenho aprendido.

Aprendi a guardar gotas d´água na barba
e dali gotinhas de luz entre os fios.
E que a barba é um segredo bobo,
mas as mulheres jamais terão. (algumas)
Aprendi que sou mais chato com fome que criança com sono,
e que com sono, sou uma criança com fome.
Aprendi a atravessar os dias um à um
assobiando alto, fazendo algum barulho com as mãos
pra alertá-los.
Para os relógios não gritarem no meio-dia:
- É hora de abraçar!
E eu não abraço.

Aprendi que a solidão é esse gostinho amargo
da vontade de estar junto,
e se não fosse, seria o estar junto,
esse gostinho amargo
de não estar só.

Tenho aprendido.
Que quase nunca aprendo nada.
A não ser o que escrevo e releio,
boa memória fotográfica, salvas ao cerebelo.
E das músicas que façopoucas vão pro disco,
poucas vão ser cantadas novamente.
E que felizes são as que não são cantadas.
Pois, cada dor sabe a dor que é,
se não sabe, dói assim mesmo.

Aprendi que apêndice
é dor. (pr´alguns)
E adendo.
Qualquer coisa que se adicione ao texto depois,
mesmo que essa adição não tenha lá tanto sentido.
Aprendi:
Encher é sempre esvaziar.

Aprendi que ela é uma menina
que ela quer ser uma menina
e sonha ser uma menina
até age como uma menina
mas ralha como uma velha mulher cheia de câncrios.
E que nenhuma de suas perucas esconderá sua vontade de ter cabelos.

Tenho aprendido.

Ensinando só desaprendo
aprender é fingir que sabe
Só se aprende mesmo quando não entende
que se está aprendendo algo
Aprender é solitário
e tudo que é solitário faz bem
pois não depende de outrém
Sem egoísmos, no fundo sabemos
que no fundo mesmo,
estamos sempre sozinhos.

Tenho aprendido.
Que aprender a amar
é aprender a aceitar que mesmo
com tanto tempo,
ela é a mesma pessoa que conheci aquela tarde
e que todas as vezes me parece uma diferente.
E que dentro dos risos que ela larga
eu me apego aos mais sem graças
que são os que deixam os ossos de fora
e que mesmo com tantas aparências
estamos sempre buscando o verso das pessoas.
Mesmo sabendo que pra cada verso claro,
um lado escuro está pra ser mostrado.

Tenho aprendido,
urgentemente
que escrever é um remédio ofegante
e que nenhuma palavra guarda segredo da outra
e estão sempre contando seus meios
já os fins, estes nós mesmos os ditamos.

Um comentário:

Isaac Frederico disse...

soberbo texto, soberbo poema ..! sem sombra de dúvidas um dos melhores que li nas últimas semanas, riqueza por entre as linhas, detalhes sutis e tocantes, a poesia é tão vida quando bem escrita...
foda !