27.8.07

Analógico

“Esse peixe é tão lento que até um sujeito analógico o pesca”, menosprezou o cidadão-digital. Os peixes modernos, como tudo o que é contemporâneo, não dão conta das expectativas depositadas sobre eles – ou são as expectativas de hoje em dia que colapsam qualquer objeto de sua incidência, na medida da nanotecnologia e a ultrainformação condensada em uma impressão digital, acessível somente aos nervos, toda a cartografia de tudo que já se pensou em todos os segundos de todos os big-bangs desde o instante AA#B00345772-21.
Isto é obviamente uma piada, esta é a impressão que tenho, mas ao mesmo tempo é difícil, eu diria inatingível, se ver livre da correria que, quanto mais distante do epicentro, menos sentido tem. É um fenômeno de textura que, apresentando um padrão de mosaicos, na escala natural, revela imagens concomitantes em escala cotidiana, e se apresenta ao tato com sofreguidão e piedade, na escala macro, quanto mais macro, maior, por definição, e maior, linearmente, a palavra-semente, ruim, àspera, sobre a boa nova, que de nova tem o bilhar AA#B00345772-21 de anos.
A perdição e náusea vieram a galope para os visionários deste fato, os magros que andaram, andaram, andaram e andam, carregando em suas faces a face solta do fato dependente do tempo para ser fato; sem vértebras somos reféns da gravidade e não podemos andar para diante, talvez a condensação da informação e a rapidez que nos é exigida sejam a vértebra necessária – ou talvez a vértebra a mais que nos pune com um desequilíbrio do nosso centro de gravidade, quem sabe?, quem tem referencial suficientemente cósmico para afirmar? E aí estamos outra vez nos terreno pantanoso da dúvida eterna, eterna desde sempre, a contingência nunca utilizada, o continente pan, uno, a questão que nos é inseparável desde… e lá vem outra vez o “desde”, o tempo, a informação, o labirinto, o desmembramento, pedaços cognoscentes de Deus e servos obedientes do Eu.

(Escrito do livreto "Reações ao Grande Absurdo - A Palavra", parte 2 da obra Acontecente)

Um comentário:

Heyk disse...

Caramba, tá aí. Fiquei contente. Mas mesmo e de verdade. E fui lendo, sem pretensão, sem saber de quem era, olhando por parágrafo e caramba. Tá aí. É seu? e o livreto cadê?
E a primeira parte, cadê? E outra, acho que vou responder essa conversa.